Por: Isabel Fomm de Vasconcellos*
Um dos livros que escrevi chama-se “As Aventuras da SuperMulher”. É engraçado, porque a minha supermulher, quando está em plena missão, voando pelos céus de São Paulo, lembra-se que tem que ir buscar as crianças na escola ou chegar a tempo para jantar com o marido.
Na verdade, é uma brincadeira sobre a situação de todas nós, mulheres brasileiras, que trabalhamos e que, no meio do trabalho, somos desconcentradas por pensamentos domésticos, de nossas segundas (ou serão primeiras?) obrigações do lar.
Apesar de sermos hoje 53% da força de trabalho formal do país e sermos ainda mais de 25% dos chefes de família, nós ainda fazemos das nossas obrigações domésticas algo prioritário e muito, muito importante.
Por mais que tenhamos auxiliares profissionais (as famosas empregadas, que quase sempre são mais que isso), por mais que priorizemos nossas atividades profissionais, o Lar ainda é, culturalmente, o símbolo do sagrado.
Ora, precisamos nos decidir: Se optamos pela carreira e ela é a coisa mais importante na nossa vida, o trabalho e as obrigações domésticas não poderiam nos angustiar. Mas é o ranço cultural. Afinal, administrar uma casa não é nada de tão especial assim. Fazer o jantar, passar as camisas do marido ou mesmo limpar a casa (com o auxílio das máquinas maravilhosas que temos hoje) não é nada de tão complicado diante dos problemas profissionais que enfrentamos e vencemos.
Acredito que o grande problema seja o abrir mão desse papel de Rainha do Lar. Assim, nós trabalhamos fora de casa, muitas vezes somos responsáveis pelo sustento de nossas famílias, mas mesmo assim supervalorizamos dentro de nós, em nossa emoção, o trabalho doméstico. Ora, se cada membro da família, lavar o seu próprio prato de jantar, não haverá uma tonelada de louça para ser lavada. Se cada membro da família fizer a sua própria cama e ficar responsável por sua própria roupa de cama, banho e de uso pessoal, não haverá uma tonelada de roupa para lavar e passar.
Mas somos nós mesmas, as donas-de-casa, as rainhas do lar que não queremos racionalizar e distribuir o trabalho doméstico. Porque o ser humano nunca quer renunciar a nenhuma espécie de poder. E nós, mulheres, embora tenhamos conquistado também o poder de gerar dinheiro, de fazer uma carreira, não queremos (essa é a verdade: NÃO QUEREMOS) dividir o papel de rainhas do Lar.
Dividindo o trabalho entre a família, criando nossos filhos para isso, e exigindo dos nossos maridos, a divisão do trabalho doméstico, estaríamos facilitando enormemente a nossa vida, mas estaríamos também renunciando a um poder que um dia nos foi dado: a de donas absolutas da nossa casa.
Teríamos que aprender a delegar completamente as funções domésticas a terceiros. Na verdade, poucas profissionais – sejam elas executivas, médicas, políticas, taxistas, professoras ou lixeiras – conseguem.
*Isabel Fomm de Vasconcellos é escritora e jornalista especializada em saúde. [email protected]
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