Por : Isabel Fomm de Vasconcellos*
Tenho alguns amigos que parecem ter parado no tempo. Tem um que se veste como nos anos 1960. Outro que acredita na boa intenção dos governos comunistas. Outro que acredita em políticos brasileiros. Outro que só frequenta barzinhos de rock dos anos cinquenta. E – pasme – tem um que só anda de fusca. Ah! Também tem quem não use micro-ondas e o cúmulo é uma das minhas amigas que não tem computador nem máquina de lavar roupa (acha anti-higiênico).
Isso tudo, porém, são apenas idiossincrasias particulares.
O que acredito ser mais sério (e mais triste), por mais abrangente, são as feministas velhas.
A história das mulheres é, como a de outros estamentos sociais discriminados, complicada. Bem ao contrário do que o filme “As Sufragistas” deixa subentendido, o movimento de mulheres pelo direito ao voto não tem a sua origem na classe operária. As primeiras sufragistas eram mulheres de classe alta, educadas (um privilégio no século XIX, quando as mulheres do povo não eram sequer alfabetizadas) e agregavam aos seus grupos as operárias, liderando-as na maior parte das vezes. Emmeline Pankhurst (Meryl Streep, no filme) é o exemplo típico. Mas existem inúmeras outras.
As mulheres organizadas em movimentos feministas foram as responsáveis por vários avanços sociais na condição da mulher.
Só para citar os principais, assim de memória: direito ao voto, direito à guarda dos filhos na separação do casal, direito à propriedade.
Muitas outras mulheres lutaram, e ainda lutam, pelo direito à educação. Um exemplo nacional, do começo do século XX, é Anália Franco. Outras ainda, lutaram pela liberdade sexual e econômica (o fim da dependência da chamada “dona de casa”) como Betty Friedan e Camile Paglia, sem esquecer da grande Simone de Beauvoir. E aqui já passamos da segunda metade do século XX.
Mas não se iludam. Se não fossem as feministas, as mulheres de hoje estariam exatamente como as suas antepassadas: sem direito a nada. Foram elas, sim, que começaram a abrir um caminho. Caminho esse que as mulheres do século XXI parecem pensar que está totalmente aberto. Não está. Vide apenas o caso recente do estupro coletivo e as figuras “importantes” do mundo político que querem revogar a Lei do Aborto, que é de 1940 e que, para ser cumprida, até hoje a vanguarda das mulheres da Saúde Pública tem que brigar muito.
Relembro tudo isso para chegar a outra questão crucial: o sexo.
Foi aí que as feministas primaram por errar e erraram feio.
Primeiro erro: querer que mulheres e homens sejam iguais. Evidentemente, não são. Sexualmente, são completamente diferentes.
Impedidas de darem vasão ao seu natural desejo, as mulheres foram inventando a falácia do “Sexo, para mim, só com amor” – ideia essa que ainda sobrevive – pasme! – em muitas jovens de hoje, pleno século XXI, e que estava presente em outra grande falácia: a suposta “revolução sexual” dos anos 1960, cantada em verso e prosa, e que muita gente credita ao surgimento da pílula anticoncepcional, porque esta proporcionaria às mulheres fazer sexo sem medo de engravidar sem querer.
Pura mentira. O medo de engravidar nunca impediu mulher alguma de fazer sexo. Quem as impedia, ou as impede, são os homens. Mortos de medo que o filho fosse do vizinho, eles inventaram essa tal de monogamia. Mas jamais a praticaram, não é mesmo? Monogamia para, antes da criação do teste do DNA, ter certeza que o filho era dele mesmo.
Uma das pérolas do machismo é a divisão das mulheres em duas categorias: a mulher direita, para casar e ser mãe dos filhos deles e as putas, para darem prazer a eles. Prazer para elas? Nem pensar. A que vai parir os filhos “de família” não deve nem desconfiar que existe prazer, para não ir procura-lo em camas outras. E as putas não precisam de prazer, estão sendo pagas para dar prazer.
Foi com essa herança que as mulheres – feministas ou não – chegaram à famosa (e falsa) “revolução sexual dos anos 1960”. Se antes dessa revolução, não ser virgem ao casar era um horror, agora deixar de ser virgem era obrigatório. Se antes era proibido ter prazer, agora ter orgasmos (de preferência múltiplos) era obrigatório. Mais besteirol, como se vê.
O resultado dessa salada de falácias sexuais foi um pensamento “feminista” bastante equivocado. Mais ou menos assim: as mulheres liberadas sexualmente estão prontas a proporcionar todo o prazer que o homem delas necessita e, assim, ele não precisa de outras. Ai! Ledo engano, hein? De fato, ninguém, nenhum ser humano, homo ou hetero ou bissexual, é monógamo. A não ser por opção, com grande esforço e renúncia.
Ou seja: não é o homem que tem que assumir a monogamia inventada para o sexo feminino. É a mulher que precisa assumir o seu desejo por um ou por vários homens e/ou mulheres. Não existe esse papo – tão na moda na minha juventude – de “mulher objeto”. Quando uma mulher leva pra cama um sujeito que ela deseja, sem fantasias românticas, no dia seguinte ele é “página virada no seu folhetim”, como diria Chico Buarque. Ou seja: ele é o homem-objeto dela. Mas, se na cama, os “objetos” foram felizes, tiveram orgasmos, produziram endorfinas, então, é claro, deram a sua contribuição para a felicidade universal. Afinal, só os infelizes são realmente maus. O mundo dos bons é o mundo das pessoas felizes. “Nem sempre somos felizes quando somos bons, mas sempre somos bons quando somos felizes”, já diria Oscar Wilde, uma das minhas citações prediletas.
Nossa, que conversa comprida essa!
Então encurtemos: existem hoje, no Brasil principalmente, muitas feministas que são como os meus amigos que abrem esse artigo: vivem no passado. Essas são (mas nem todas as feministas o são) as realmente “mal-amadas”.
Feministas que não perceberam que a mulher é completamente diferente do homem, em sua biologia e, consequentemente, em suas emoções e em seus pensamentos.
Não perceberam que o maior poder da mulher sobre o homem sempre foi o poder da sedução e exerce-lo não significa estar posando de “mulher-objeto”.
Não perceberam que, justamente pelo dom da maternidade, a natureza dotou a mulher de uma poderosa intuição e que, consequentemente, a cultura feminina – apesar das bruxas queimadas nas fogueiras da inquisição – contempla todo um conjunto de acertos empíricos, que as mulheres usam com a naturalidade de quem sabe que o coração tem razões que a razão desconhece.
Esse tipo de feminista jurássica, nega a beleza e a felicidade que o sexo livre e sadio pode trazer a todos nós. E censura a manifestação da sensualidade, confundindo-a com a manifestação do machismo. O machismo está aí, tão forte quanto sempre foi. Está em todo o mundo e é um dos fatores que geram a infelicidade global.
Machismo nunca. Sensualidade, sempre!
Isabel Fomm de Vasconcellos é escritora e jornalista especializada em saúde.
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