Por: Isabel Fomm Vasconcellos*
Desde que eu comecei a fazer programas femininos na TV, a discussão da gravidez na adolescência preocupa médicos, educadores, psicólogos e pais.
Há mais de 20 anos que o número de adolescentes grávidas no Brasil não se altera. E nessas duas décadas vimos aparecer uma série de serviços públicos e ongs dedicadas à orientação sexual das adolescentes, a informação sobre métodos contraceptivos na mídia se multiplicou e até os próprios métodos, como as pílulas anticoncepcionais, evoluiriam e melhoraram.
Vinte por cento das grávidas brasileiras são adolescentes. E entre essas, muitas são apenas crianças entre 9 e 11 anos de idade.
Preocupada com esses dados alarmantes, a secretaría de saúde do Rio de Janeiro propôs distribuir, pelo correio, pílulas anticoncepcionais para as adolescentes. Foi um estremecimento: o prefeito vetou, alguns médicos se indignaram e o assunto ganhou a mídia.
Acontece que o buraco é mais embaixo.
Informação é o que não falta. Nem métodos contraceptivos. E nem o acesso a eles, já que qualquer posto de saúde pode atender essas meninas e fornecer gratuitamente o método adequado para elas, ainda que o atendimento público de saúde deixe muito a desejar em nosso país.
O que é, então, que está faltando?
Perspectivas de vida, explicam os especialistas.
E isso não acontece apenas com as adolescentes, mas também com uma grande parte das mulheres adultas.
Consciente ou inconscientemente, as meninas e as mulheres desejam a gravidez porque esta pode lhes proporcionar um novo status social. Pode lhes proporcionar uma perspectiva de vida que lhes falta no momento.
Parece maluco, mas é verdade. Sem considerar a responsabilidade que traz uma criança, sem considerar as dificuldades da criação de filhos e todas as suas conseqüências, muitas meninas e mulheres se arriscam na possibilidade da gravidez porque sabem, e sentem, que esta poderá lhes proporcionar um status a mais.
Meninas que não enxergam uma perspectiva de futuro, mulheres que estão cansadas de lutar por um lugar ao sol, vêem na gravidez, ainda que temporariamente, uma oportunidade de reconhecimento social. Afinal, a sociedade tende a respeitar as grávidas e até dar-lhes, por exemplo, lugar no ônibus.
E isso não sou eu quem está dizendo, é o que dizem os profissionais de saúde e de assistência social que, no dia a dia, trabalham com a gravidez indesejada (que, afinal, não é tão indesejada assim!).
Então, o problema da gravidez na adolescência não se restringe à informação ou ao acesso aos métodos contraceptivos. Vai muito mais além, passando por problemas sociais que, há muito, assolam o nosso país, como a educação deficiente, a desvalorização da cultura, o materialismo exacerbado e a crônica falta de dinheiro para atingir os padrões que a sociedade considera ideais.
Enquanto não resolvermos os problemas de educação, de emprego; enquanto não conquistarmos uma distribuição de renda mais justa e uma maior igualdade de oportunidades na sociedade, de nada servirão (infelizmente) medidas como distribuição gratuita de métodos contraceptivos.
É uma triste perspectiva feminina essa: a de se valorizar perante a sociedade por causa de uma simples gravidez. Mas – lamento dizer – é a realidade de milhões de brasileiras.
Um abraço,
Isabel
*Isabel Fomm Vasconcellos é produtora e apresentadora do Saúde Feminina (de segunda a sexta, meio dia, Rede Mulher de TV) e autora, sendo “Sexo Sem Vergonha” seu último livro, publicado pela Soler Editora.
www.isabelvasconcellos.com.br