Por: Isabel Fomm de Vasconcellos*
Tinha eu acabado de chegar da loja de sapatos, feliz da vida, com um pretinho meia pata, salto 15, que comprara para usar na Noite de Autógrafos do meu livro quando, navegando em sites de moda da Internet, dei de cara com essa pérola:
“depois dos 60 anos de idade, a ordem é conforto: scarpins de salto médio, vestidos largos e confortáveis, maquiagem discreta…” Enfim: estilo vovozinha. Eba! De olhos esfumaçados, sombra metálica, cílios postiços, enormes unhas vermelhas e muito blush…. Eu tenho mais de 60…
Atônita, fui conferir a data da revista que eu estava lendo. Pensei, por um instante, que tivesse entrado no arquivo morto da tal consagrada publicação e estivesse lendo uma matéria dos anos 1970…, mas não. Era hoje mesmo…
Faz algum tempo que isso aconteceu e ainda não consegui me esquecer do impacto que me causou esse horror de preconceito. Por analogia lembre-me de uma apresentadora de TV afirmando “o pessoal da mais de 40 ainda tem certa dificuldade com os computadores”… Eu, que, no ano em que a moça em questão nascera – 1991 – escrevia no caderno de Informática do Estadão explicando porque não podia mais viver sem computador… (Naquele tempo, máquinas jurássicas de telas verdes).
Seria de se esperar que os mais jovens, dessa segunda década dos anos 2000, montados em seus tablets e smarts fones, fossem mais arejados e, por bem informados, não saíssem por aí escrevendo ou afirmando coisas ultrapassadas como essa.
Cada vez mais, as mulheres e os homens, a quem alguns insistem em classificar como “da terceira idade”, estão por aí brilhando e esbanjando charme e elegância. Caetano Veloso, do alto dos seus Armani; Elke Maravilha, com a autoridade de seu estilo mega perua; Chico Buarque beijando a mulher de outro na praia; Roberto Carlos, desfilando na avenida de camisa de cetim; Paulo Coelho, esnobando em Genebra e escrevendo livros em 15 dias; Sir Paul McCartney, arrebanhando multidões; Madonna fisgando os jovens Jesus dos países onde se apresenta; Jacques – com mais de 80 – e Janine – com quase isso – esbanjando vitalidade no comando de sua imensa franquia de beleza na Rua Augusta… Quem mais? E eu mesma, Isabel Fomm de Vasconcellos, lançando livros, criando sites, fazendo programas de Web TV e na TV aberta…
Somos todos “velhos”.
Somos lindos! E ativos! Elegantes, antenados e sábios.
Muito diferentes do que, milenarmente, a humanidade chamou de “velhos”.
“Velho é quem se julga”, já preconizava meu pai, nascido em 1908.
Usufruindo de todo o conhecimento que a humanidade acumulou a duras penas, hoje sabemos que a atividade física regular, a atitude mental sadia, a alimentação inteligente, os botox e preenchimentos, os mais variados implantes e as pílulas para tudo (dos antidepressivos aos xenicais da vida) são as nossas armas para impedir que o exército de diabinhos pró-doença invada o nosso cotidiano, a nossa mente e nos faça entregar os pontos, a deitar na rede esperando a morte chegar, para que passemos a acreditar que estamos na Última Idade.
Brevemente, teremos a Fonte da Juventude nas células tronco… E quem estiver realmente acordado e a fim de muito faturamento e prosperidade, estará, desde já, produzindo produtos fashion para o mercado dos velhinhos turbinados.
Afinal, nós somos as gerações do século XX, o século que transformaram radical e surpreendentemente o mundo, que levaram o planeta da carroça à comunicação instantânea; nós somos dos anos loucos, da música de Cole Porter aos quadros de Dali; nós somos sobreviventes do Holocausto, a inimaginável tragédia que nos fez repensar a vida; nós somos dos Fifties, inventamos o rock, a bossa nova e os rabos de peixe; nós somos os sixties que queriam um mundo de paz e amor, nós somos a geração dos Beatles, da minissaia, da liberdade sexual, do faça amor não faça a guerra e, pode crer, damos de dez a zero em muitos exemplares dessa garotada “sustentável” e que morre de medo da crítica.
Batom vermelho, salto muiiito alto, tênis de corrida, e o smart fone no bolso… Nós somos o Exército dos Velhos dos anos 2020. E saiam da frente, pois vamos passar. Ou atropelar.
(foto: Carmen Dell’Orefice, modelo americana aos 81)
*Isabel Fomm de Vasconcellos, escritora e apresentadora de TV