Por: Isabel Fomm Vasconcellos*
Relatório da Unesco, de novembro de 2003, mostra que a maioria das crianças sem escola, no mundo, é composta por meninas. Não é nada surpreendente. Nas famílias em que o estudo pesa no orçamento, a primeira a sair da escola é a menina. Os meninos continuam estudando, mesmo com o sacrifício monetário da família, pois a sociedade ainda entende que eles serão os provedores de seu próprio núcleo familiar. E as meninas não precisariam mesmo estudar pois o seu destino é parir, criar filhos e no máximo administrar os serviços domésticos. No entanto, a realidade desmente essa idéia. No Brasil as mulheres já são mais de metade da força de trabalho formal e quase 1/3 de todos os chefes de família são do sexo feminino.
O relatorio diz ainda que, em 54 países, a igualdade entre os sexos em matéria de educação está muito longe de ser alcançada.
O fato é que as mulheres começam a vida com inúmeras desvantagens em relação aos homens. Começa pela auto desvalorização e consequente baixa auto estima. Milênios de discriminação e inferioridade social fizeram com que as próprias mulheres introjetassem a idéia de que eram mesmo seres inferiores, com menos capacidade, mais frágeis e menos inteligentes que os homens. Uma mulher sem um homem estaria “desprotegida”. Essas falsas idéias são transmitidas de geração para geração e criam nas meninas a expectativa do tal “príncipe encantado” que resolveria todos os seus problemas, medos e angústias. Tenho uma amiga jornalista que, certo dia, estava com medo de dirigir seu carro pela estrada conhecida como a “estrada da morte”, dado o alto número de acidentes que lá ocorriam. Mas ela precisava ir. Por isso contratou um homem para dirirgir o seu automóvel. Quando me contou eu perguntei:
– Ah, um motorista profissional?
– Não – foi a resposta.
Para ela bastava ser homem. Se ele fosse um barbeiro, de dirigisse pior do que ela própria, ainda assim ela se sentiria mais segura porque estava com “um homem”.
É assim que inúmeras mulheres colocam seus destinos e suas esperanças completamente na mão de “um homem” que pode – e muitas das vezes o fazem – decepcioná-las gravemente.
Além disso parece um pouco injusto que os coitados dos homens tenham que ser também responsáveis pela segurança e realização de suas companheiras.
Como existem mais mulheres do que homens no Brasil, muitas de nós estão condenadas a solidão mesmo ou ao triste papel de ser “a outra na vida dele”.
Muitas mulheres estão sendo, hoje, as únicas responsáveis pelo sustento e pela formação de seus filhos. Mas muitas mulheres de sucesso chegaram lá apesar de não terem tido as mesmas oportunidades, de carregarem esse fardo de inferioridade pela vida afora.
Eliza Farnham, que viveu nos Estados Unidos no século XIX e participou da Primeira Conferência Feminista da História, a Sêneca Falls, realizada em 1848, dizia que os homens haviam decidido reprimir as mulheres porque sabiam de da natural superioridade do sexo feminino sobre o masculino. Eu já não seria tão radical. Mas ficaria muito feliz se, antes da minha morte, conseguisse ver cumpridas as metas da Unesco para a eliminação dessas desigualdades entre os sexos.
*Isabel Fomm Vasconcellos é produtora e apresentadora do Saúde Feminina (de segunda a sexta, ao vivo, às 14h00, na Rede Mulher de TV e Rede Família) e autora do livro “A Menstruação E Seus Mitos”, Ed. Mercuryo