Por: Isabel Fomm Vasconcellos*
Vi, numa grande emissora de TV, uma matéria sobre mulheres que ocupam cargos que, até bem pouco tempo, eram de exclusividade dos homens. E daí? Todo mundo sabe que as mulheres foram, nas últimas décadas, ocupando espaços na sociedade, no mundo produtivo e fazer uma matéria sobre isso parece apenas mais um preconceito. Como se estas mulheres fossem exceções. Não são. As brasileiras são quase metade da força produtiva do país e, há décadas, realizam funções que, antes, eram apenas masculinas.
Mas, não contente em alardear mais um preconceito contra as mulheres, a emissora ainda terminou a matéria perguntando às entrevistadas qual era o grande sonho da vida delas e forçou a barra para que elas respondessem que queriam casar e ter filhos.
Morri de rir. Ninguém entrevista um executivo e força a barra para que ele diga que o seu grande sonho é casar e ter filhos.
Parece que certos segmentos do nosso jornalismo gostariam de que as mulheres voltassem para as fraldas, para o fogão e para a máquina de lavar.
Mas tudo bem. As conquistas femininas na sociedade, as mais antigas, não têm muito mais de 100 anos e as mais recentes datam de apenas três décadas. Parece-me natural que a sociedade ainda não possa nos engolir como seres iguais (na diferença) aos homens, no que se refere à capacidade profissional e de realização pessoal, independentemente do sucesso na vida familiar.
Mas não deixa de ser engraçado pensar numa matéria semelhante que entrevistasse homens e que fechasse concluindo que o grande sonho daqueles empresários e executivos era ter um bando de filhos.
Ora, convenhamos, casar, ter filhos, é naturalíssimo. Todo mundo acaba fazendo isso. Isso não é nenhum sonho, nenhum objetivo de vida. É apenas da vida. Como respirar ou fazer amor.
Imagine a cena:
– Qual é o seu grande sonho?
– Ah, eu sonho em respirar e ir ao banheiro.
Se unir a alguém, constituir família, criar os rebentos é tão natural e previsível como respirar ou ir ao banheiro.
Isto não é projeto de vida. É apenas a vida.
Projeto de vida é se realizar em alguma profissão ou atividade que corresponda à vocação e às tendências de cada um.
Infelizmente a burríssima televisão brasileira ainda quer reduzir as mulheres à nada. Mesmo quando finge, descaradamente, as estar valorizando.
* Isabel Fomm Vasconcellos é apresentadora e produtora do Saúde Feminina (segunda a sexta, meio dia, na Rede Mulher de TV) e autora de vários livros.
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