Por: Isabel Fomm Vasconcellos*
Apesar de as mulheres estarem conquistando cada vez mais postos de trabalho, se destacando em suas carreiras, mostrando a sua capacidade profissional, ainda é muito difícil para uma mulher confiar no taco da outra. Na hora de escolher médico, dentista, advogado, a maioria – consciente ou inconscientemente- escolhe profissionais do sexo masculino.
Quando uma mulher é promovida dentro de uma empresa, suas colegas são as primeiras a desconfiar das razões dessa promoção, não aceitam se subordinarem à nova chefe, criam um montão de problemas. Se a promoção acontece com um homem, nas mesmas circunstâncias, essas mesmas mulheres acham tudo ótimo.
Ninguém pesquisou, mas pode ter certeza que as nossas poucas políticas, em cargos eletivos, tiveram mais votos masculinos do que femininos.
Os homens são cúmplices. As mulheres, rivais.
Se um homem vê a mulher de um amigo almoçando com outro homem, ele pode imaginar mil coisas, mas fica na dele. Não se manifesta.
Se uma mulher vê o marido de uma amiga almoçando com outra mulher, ainda que seja um inocente almoço profissional, logo dá um jeito de contar para a amiga.
Veneno é a arma predileta das mulheres. Nos dois sentidos: figurado e literal.
Por que tanto ódio e desconfiança com relação ao nosso próprio sexo?
Duas razões poderosas se imbricam na resposta a essa questão.
Primeiro, as mulheres passaram milênios tendo que lutar pelo melhor homem disponível nos arredores. Condenadas a serem apenas mães e esposas, ou prostitutas, a única chance de sucesso pessoal era dada pelo sucesso em agarrar “o melhor partido”. Neste contexto, como poderiam as mulheres ser cúmplices? Sempre foram competidoras ferozes.
Além disso, séculos e séculos de desvalorização da competência feminina estão em nossos inconscientes, fazem parte da nossa herança cultural e talvez até mesmo da herança genética.
Quando uma mulher não confia na profissional mulher, quando ela nega a importância da colega promovida à chefia, quando ela desvaloriza a outra, está apenas provando o baixo valor que dá a si mesma. Se você se acha inferior, incompetente, menos capaz que os homens, como vai acreditar que uma outra, que também é mulher, pode ser capaz e competente?
Com as mulheres galgando cada vez mais posições de sucesso e de importância na sociedade, é claro que isto está mudando. Mas não tenha ilusões. Cinqüenta anos de ascensão social é muito pouco para transformar mentalidades que se condicionaram por milênios de dominação masculina.
O sucesso das mulheres incomoda as mulheres. Em vez de perceber que o sucesso de uma fala a favor de todas, nós estamos prontas a criticar tudo numa mulher de sucesso: da roupa ao comportamento, da história de vida à forma do corpo. Temos que achar um defeito (ou vários) nela para justificar o nosso próprio e milenar sentimento de inferioridade.
Se você, racionalmente, acha injusto esse preconceito feminino contra as próprias mulheres, pode, sim, lutar contra ele, analisando com sinceridade os seus sentimentos e não se deixando levar pelo primeiro impulso da crítica.
Graças a Deus, existiram, na história, muitas mulheres que conseguiram se unir e superar esse sentimento de ódio e de inferioridade. E, unidas, lutaram para que todas as mulheres pudessem conquistar os direitos que temos hoje na sociedade: o de votar, o de ter prazer sexual, o de estudar, o de fazer carreira, o de ser independente financeiramente. E estas foram as feministas. Que muito sofreram, foram presas, perseguidas e até mortas para que, hoje, você tivesse opções. E torcemos o nariz para elas, dizemos horrorizadas “eu não sou feminista”, fazendo, sem querer, o jogo machista da sociedade que identificou o rótulo feminista com mulheres pouco femininas, feias e mal amadas.
Isso é mentira. Isso é o contra-feminismo.
Foram elas que conquistaram todos os direitos que você tem hoje. Elas e mais ninguém.
Se você estuda, se tem uma carreira, se tem prazer no sexo, se faz a sua contracepção, se vota, você deve tudo isso a elas, às odiadas feministas. E, como estas, talvez fosse bom pensar em se unir a outras mulheres, numa causa comum, num destino comum que, em última instância, é o de que o nosso sexo deixe de ser considerado frágil, inferior e pouco capaz.
* Isabel Fomm Vasconcellos é produtora e apresentadora do Saúde Feminina (de segunda a sexta, meio dia, na Rede Mulher de TV) e autora do livro “Sexo Sem Vergonha”, Soler Editora, entre outros.