Por: Isabel Fomm Vasconcellos*
Existe na nossa sociedade ocidental o terrível mito do amor. Em nome do amor, tudo seria possível, tudo seria maravilhoso.
Nas mulheres isso é ainda mais forte e mais sério. As mulheres são naturalmente (biologicamente) mais sensíveis e, embora a ciência nada comprove, mais intuitivas. Embarcam com mais facilidade no mito do amor.
Calma, minha amiga, não estou dizendo que o amor não existe. É claro que ele existe mas não é exatamente aquilo que a gente pensa que seja.
Em nome do amor materno, por exemplo, atiram-se pedras naquela mãe que, por qualquer razão, abandona a sua cria. Todo mundo a condena, sem sequer examinar a sua vida. Ela pode estar com depressão pós parto. Pode ter sido obrigada a gestar um filho fruto de violência sexual. Pode, simplesmente, não ter a menor vocação para a maternidade. Sim, porque outro mito é crer que todas as mulheres, apenas porque estão fisicamente aptas a gerar filhos, são vocacionadas para o difícil exercício da maternidade.
E, se por acaso, uma mãe não sente amor por seu filho, pobre dela: a sociedade a vê como um monstro e ela própria, sentindo-se culpada, tenta exercer o que não sente.
Jovens meninas que vivem sua primeira atração sexual, imediatamente acreditam estar amando o menino. Ele não. O menino sabe que o que ele quer daquela menina é sexo e pronto. Mas, para a menina, o sexo tem que ter a justificativa do amor. E ela se ilude. E a ilusão pode fazê-la sofrer muito. Amor não é tesão. Ele pode, é claro, conter o sexo, mas sexo e amor são coisas separadas e muito diferentes.
Como fomos ensinados a respeitar e a desejar o amor, vamos pela vida confundindo as bolas. Nem sempre amamos os nossos irmãos de sangue, os nossos parceiros sexuais, os membros das nossas famílias. Nem sempre. Mas nos sentimos no dever de amá-los. E aí começam os desastres: da falsidade à hipocrisia e, o que é pior, o auto-engano.
Para viver em harmonia na sociedade, já que somos todos absolutamente interdependentes na comunidade humana, talvez fosse mesmo muito bom tentar praticar a máxima cristã de amar ao próximo como a si mesmo. Mas esse é um amor racional, que se pratica através do difícil exercício do respeito pelo outro, do respeito pelas diferenças, da humildade de saber que nunca se é o dono da verdade. Esse é o amor construído, o amor da tolerância. Será, minha amiga, que existe algum outro tipo de amor?
Esse negócio de amor à primeira vista entre homem e mulher deve ser, na verdade, paixão à primeira vista. Porque amor se constrói. A partir da paixão. A partir do laço de sangue. Você ama seu filho, quando ele nasce, porque se preparou durante longos 9 meses para isso. Você construiu. Você ama sua mãe porque ela a amou, por toda a sua infância, sua adolescência.
Quem não foi amado, dificilmente consegue amar. O amor não é instantâneo, ele é construção.
Por isso, pelo seu bem e o de todas as mulheres, pare com essa bobagem de achar que você ama todo homem que te atrai. Atração física não é amor. Pode até se transformar em amor. Mas não é. Nem é preciso amar para fazer sexo. Você pode se realizar sexualmente com uma pessoa sem que,necessariamente, ame essa pessoa.
Esse mito do amor incondicional, do amor instantâneo é outro sintoma da nossa longa discriminação social, como mulheres. Faz parte da vasta lista de comportamentos impostos a nós, para que fossemos dóceis e submissas.
Mas nós não somos assim. E podemos sim ter uma infinita capacidade de amar nossos companheiros, nossos pais, nossos filhos, nosso trabalho. Porém, qualquer amor não nasce simplesmente do nada. Ele é construído, dia a dia, pelo cultivo (e pela nossa vontade) dos sentimentos mais positivos que possamos encontrar em nossas almas.
Um abraço e até a próxima
Isabel
*Isabel Fomm Vasconcellos é produtora e apresentadora do programa Saúde Feminina, segunda a sexta, ao vivo, ao meio dia, na Rede Mulher de TV e autora do livro “A Menstruação E Seus Mitos”, Ed. Mercuryo.